(…)
É verdade que João dos Santos viveu numa época em que os
conhecimentos neurobiológicos eram incipientes e as formulações teóricas sobre
a doença mental muito especulativas. Tudo era explicado pelas perturbações da
relação da infância ou pelas vicissitudes do desenvolvimento em famílias
perturbadas: hoje sabe-se que há crianças com doenças “mesmo” biológicas,
outras com temperamento difícil desde uma fase muito precoce da vida, outras
ainda com disfunções de causa genética que as tornam particularmente vulneráveis.
Assim, deveríamos ser agora capazes de ter uma visão mais aprofundada dos
mecanismos geradores do mal-estar infantil e, se não tivermos uma visão
dogmática, poderíamos dar uma resposta terapêutica integrada de melhor
qualidade. No entanto, é também agora evidente o excesso de medicação em muitas
situações, o provável exagero no diagnóstico de hiperactividade com défice de
atenção e o recurso excessivo a institucionalização de crianças e jovens, em
muitos casos sem o necessário trabalho prévio com as famílias de origem
(existem cerca de 11.000 menores de 18 anos em regime de institucionalização),
para não falar da escassez de técnicos com boa formação em saúde mental
infanto-juvenil.
(…)
Ao fundar com Manuela Ramalho Eanes o Instituto de Apoio à
Criança (a que, aliás, queria apenas chamar Instituto da Criança), João dos
Santos chamava a atenção para a necessidade de uma verdadeira cultura da
criança. Tal significa que a criança não tem sempre razão (como vejo ser
defendido por alguns pais permissivos), mas quer dizer que o respeito pelos
mais novos deve constituir um pilar essencial da organização de uma sociedade.
As crianças e os idosos, os mais vulneráveis, devem merecer todo o apoio, em
todas as circunstâncias.
(Público de hoje)
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