Desculpa-me por andar a ser uma educadora um bocado ausente. Entre tantos
desafios que a vida coloca a um adulto, deixei-te um pouco entregue a ti
próprio. Por isso, é apenas natural que estejas demasiado solto e rebelde e
estejamos a ter alguns problemas por causa disso...
Mas vamos resolver isto entre os dois, sim? Agora já estou a prestar
atenção e de volta ao meu papel de educadora.
Eu sei que estás programado para memorizar prioritariamente as
coisas más que vão acontecendo. É a tua forma de me protegeres. Mas eu
não preciso de tanta negatividade, porque nem tudo o que é mau é uma ameaça e
porque, assim com tantos lembretes de que as cosias me podem doer, eu vou
ficando tristonha e amargo. A partir de agora, vou conscientemente recordar-te,
todos os dias, das coisas boas que também nos aconteceram, sim?
E claro que passas bastante tempo a remoer nos perigos futuros que podem
andar à espreita. E são tantos, verdade? Sobretudo porque eu facilito e me
ponho a ver e a ler os alertas todos de "mau tempo". E tu vais-me
dizendo "Olha as doenças", "Olha o desemprego",
"Olha a rejeição".
Mas de que me serve ir atrás destes teus cenários, se pouco ou nada há que
eu possa fazer a propósito do assunto? A partir de agora, vou começar a
ensinar-te os princípios do realismo: sim, as coisas podem correr mal; mas
também podem correr bem, e mais vale partir para a ação com base numa
expectativa positiva e uma boa preparação do que derrotada de véspera, está
bem?
E também percebo que, sem a minha supervisão e constante correção, vás
ficando progressivamente mais stressado ao longo do dia, com
as tuas áreas responsáveis por gerar ansiedade muito
aceleradas.
Por isso, a partir de agora, vou ter atenção, ao longo do dia, para ir
fazendo umas pequenas pausas, apenas para olhar em volta, reparar no que me
rodeia, reparar em mim, no meu respirar e no pulsar do meu corpo. Assim,
dou-te uns minutos espalhados ao longo do dia, para te poderes acalmar e voltar
ao teu funcionamento tranquilo e alerta.
E tenho mais uma promessa para ti. Tu és muito rápido e tens um talento
incrível para fazeres interpretações a propósito de tudo. E eu agradeço-te,
claro, porque sem essa tua capacidade de interpretação a minha vida seria um
inferno! Mas vou estar atenta para te ir indicando as interpretações que fazes
que podem trazer-me problemas.
Por exemplo, quando me dizes que aquele meu amigo não gosta de estar comigo,
porque sou sempre eu quem lhe telefona. Ou quando teimas comigo que o meu chefe
vai pensar que eu sou um incompetente se lhe disser que tenho dúvidas a
propósito do que ele me disse. Nessas alturas, prometo que te vou recordar que lá
porque és capaz de pensar uma coisa, não quer dizer que ela seja verdade.
Enfim, estou de volta! Sou responsável por ti e tenho de te educar e dar
atenção diária para que me ajudes a ter uma vida serena e proveitosa. Muito do
meu bem-estar depende de ti e tu dependes de mim para o conseguires produzir.
E, como em qualquer relação, isso exige ser cuidado regularmente.
Da tua muito amiga,
Dona
Por
Madalena Lobo, direção-geral da Oficina da Psicologia
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