(…) Ao balcão, havia
pescadores, guardas fiscais, carregadores. Acima de todas as vozes, pontificava
a de um velho fardado de guarda prisional, que desatinava ebriamente num mar de
verborreia:
- E todas as quartas-feiras, a
donzela perfumada me dá uma nota de cem coroas para que a deixe a sós com o
recluso. E à quinta, as cem coroas já marcharam em cerveja que nunca mais
acaba. E quando chega ao fim a hora das visitas, a donzela sai com o fedor da
cadeia nos seus vestidos elegantes; e o recluso torna para a cela com o perfuma
da donzela na sua roupa de condenado. E eu fico com o cheiro da cerveja. A vida
não passa de uma troca de cheiros.
- A vida e também a morte, podes
dizê-lo – respondeu outro bêbedo, cuja profissão, como fiquei logo a saber, era
coveiro. – Eu com o cheiro da cerveja tento tirar de cima o cheiro a morto. E
só o cheiro a morto te tira de cima o cheiro da cerveja, como a todos os bebedores
a que tenho de abrir a cova.
Interpretei este diálogo como um
aviso para me pôr em guarda: o mundo está a desfazer-se e tenta atrair-me para
a sua dissolução.
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