(...)
Que regras impunha?
As mesmas que a mim mesmo. Chegar a horas, trazer material, estar
quieto e calado. Depois, nos primeiros 15 ou 20 minutos de aula sou eu que
falo. É a parte da aula autoritária e expositiva. Não admito interrupções. Se
permito uma pergunta e respondo, voltarei a ser interrompido e já não saio do
mesmo lugar. Os alunos tomam notas, memorizam e tiram dúvidas no fim.
E correu sempre tudo bem?
No início do ano há sempre uns espertos que querem interromper. A
minha reacção é dizer "Pegue nas suas coisas e rua!" O maior trunfo
do professor é o dom da palavra. Se um docente não impõe silêncio nos primeiros
15 minutos da aula, vai andar 20 anos sem saber construir uma frase pois nunca
treinou o direito que tem de falar. O ensino participativo não percebe a
importância da palavra. Se imponho 20 minutos - e às vezes 90 - para expor a
matéria, ao fim de uns anos já sei seduzir pela palavra - entoar, baixar a voz,
contar histórias. Isto é muito exigente. Para expor a matéria durante 20
minutos é preciso estar bem preparado. Para dar uma aula de 90 minutos com os
alunos quietos e calados tenho de saber contar muito bem a história. Parte da
culpa é também dos professores, que gostam de ser intelectualmente preguiçosos.
Hoje nenhum professor é autoritário se não for competente no domínio do
conhecimento. Se os alunos percebem que sabemos o que estamos a ensinar, acatam
as regras mais radicais que possam imaginar. Chegava a pôr na rua o mesmo
chico-esperto todos os dias. Ao fim de um mês, chegava a dizer ao aluno que ele
já estava chumbado.
Desistia dele?
Ou quero salvar todos e vou perder todos ou castigo um ou dois e
salvo 20 e tal. Já expulsei alunos para sempre da minha sala.
Isso é contra a lei?
Toda a escola sabia, os pais sabiam, mas nunca ninguém contestou.
Sabe porquê? Havia silêncio e os alunos aprendiam.
No seu livro "A Pedagogia da Avestruz", admite que teve
atitudes radicais.
Tive um aluno que ficava à porta da sala a gozar enquanto os
colegas entravam. Um dia em que entrou, agarrei-o com a toda a força e
rebentei-lhe a camisa e só não lhe bati? Ficou de tal maneira assustado que
nunca mais apareceu nas minhas aulas. Nesse ano tive o meu carro riscado de
ponta a ponta. Mas nunca contestei. É o preço a pagar. Mas há outros focos de
indisciplina como é o caso do currículo, que promove a instabilidade das regras
e não permite ter uma ideia clara do que é uma aula. Um aluno entra numa aula
de 45 minutos, sai e entra noutra de 90, a seguir vai almoçar e tem outra de
45. Essa inconstância torna impossível sedimentar na cabeça dos alunos as
regras para estar numa aula. Com tantos especialistas em educação é incrível
que não se tenha percebido que a ideia estável de aula corresponde à ideia
estável de comportamento.
As famílias são empecilhos?
São empecilhos e criaram uma confusão entre o papel do professor e
o papel do pai, o papel do aluno com o papel do filho. Isto foi terrível no
plano da autoridade. A escola abriu-se à comunidade de tal forma que agora
qualquer um se sente com autoridade para dizer o que os professores deviam
ensinar. Quando a escola se fechar sobre ela própria, não terá de se justificar
o porquê das regras que aplica.
"Não te
ressintas se alguém discorda de ti." (Textos Xintoístas)
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