Em encontro que hoje
terminou, 2.
ºEncontro de Literatura Infanto-Juvenil da Lusofonia da Fundação “O Século”,
discutiu-se o papel e o trabalho dos professores-bibliotecários e da Rede de
Biblioteca Escolares na promoção da leitura envolvendo alunos e professores.
Foi também a abordada as circunstâncias difíceis em que muito deste trabalho é
realizado e, apesar disso, do bastante que se vai fazendo.
Recordo também uma
entrevista de Janeiro de 2014 de Teresa Calçada, até à altura responsável pela
Rede de Bibliotecas Escolares, em se focava o papel dos recursos, livros e
bibliotecas, e da sua acessibilidade bem como do impacto das novas tecnologias
e os riscos decorrentes das dificuldades económicas para este tipo de trabalho.
Retomo algumas notas sobre
uma matéria que me parece importante.
Como várias vezes tenho
afirmado e julgo consensual, a questão central, embora importante, não assenta
nos livros, bibliotecas (escolares ou de outra natureza) ou no papel dos
"tablets", a questão central é o LEITOR, ou seja, o essencial é criar
leitores que, quando o forem, procurarão o que ler, livros por exemplo, espaços
ou recursos, biblioteca, casa ou escola e suportes diferente, papel ou
electrónico.
Creio que também estaremos
de acordo que um leitor se constrói desde o início do processo educativo. Desde
logo assume especial importância o ambiente de literacia familiar e o
envolvimento das famílias neste tipo de situações, através de actividades que
desde a educação pré-escolar e 1º ciclo deveriam, muitas vezes são, estimuladas
e para as quais poderiam ser disponibilizadas aos pais algumas orientações.
Nos primeiros anos de
escolaridade é fundamental uma relação estreita com a leitura, não só com os
aspectos técnicos, por assim dizer, da aprendizagem da leitura e da escrita da
língua portuguesa, mas um contacto estreito e regular com a actividade de
leitura, seja do que for, considerando motivações e culturas diferenciadas
apresentadas pelos alunos.
Só se aprende a ler lendo,
só se aprende a escrever, escrevendo, etc.
Neste contexto, não posso
deixar de ficar um pouco preocupado com o rumo da educação escolar, neste caso
centrando-me no 1º e 2º ciclos, com a introdução das metas de aprendizagem com
os conteúdos e volume que apresentam.
Como muitas vezes tenho
afirmado e alguns estudos vão demonstrando, as metas curriculares, tal como
estão definidas na formulação e quantidade, pois não tem que ser assim,
transformam o trabalho do professor com turmas lotadas na gestão de uma
checklist de realizações.
Neste contexto curricular
não parece fácil encontrar o tempo para ler, apenas ler, algo imprescindível
para a criação de hábitos de leitura.
A relação das crianças com
os materiais de leitura e escrita assentará, provavelmente de forma excessiva,
nos manuais, na aquisição pressionada dos “objectivos” e
"descritores" e pouco mais. Restará o tempo das AECs onde, apesar de
algumas experiências interessantes, também nem sempre se encontram os conteúdos
mais adequados e o tempo de casa que em muitas famílias, cada vez mais
famílias, é curto.
Neste contexto, embora
desejasse muito estar enganado, acho difícil construir miúdos ou adolescentes
leitores que procurem livros em casa, em bibliotecas escolares ou outras e que
usem o "tablet" para ler e não para uma outra qualquer actividade do
mundo que tornam acessível.
Oxalá me engane mesmo.
*A
palavra "ler" vem do latim "legere" e queria dizer
"escolher". Era isso que faziam os antigos romanos quando, por
exemplo, selecionavam entre os grãos de cereais. A raiz etimológica está bem
patente no nosso termo “eleger”. Ora o drama é que hoje estamos deixando de
escolher. Estamos deixando de ler no sentido da raiz da palavra. Cada vez mais
somos escolhidos, cada vez mais somos objecto de apelos que nos convertem em
números, em estatísticas de mercado.
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