Há mais de 40 anos que o investigador Carlos Neto
trabalha com crianças e está preocupado com o sedentarismo. "Há pais que
já não têm prazer em brincar com os filhos" (...)
Mas hoje as crianças quase só se relacionam com as
outras em atividades organizadas.
Praticamente está tudo organizado quer do ponto de
vista das atividades no meio escolar quer nas atividade extraescolares. Se isto
ainda não bastasse têm depois uma cultura de ecrã muito agressiva. É muito
natural ver crianças à volta de uma mesa de café e não se falam, estão todas a
olhar para o iPhone. O corpo em movimento é fundamental para todo o
desenvolvimento, não só emocional, também cognitivo, social e emocional. A
escola tem de urgentemente mudar o modelo de funcionamento, quer na organização
curricular quer na forma como as crianças são mais ou menos participativas.
Temos de dar uma espécie de um trambolhão na sala de aula, no sentido de tornar
as aulas mais ativas por parte das crianças.
Falta uma política de brincadeira?
Há alguns sinais interessantes do Ministério da
Educação de tentar que a vida na escola não seja uma coisa tão formal e tão
séria, isto é, de ter tempos mais disponíveis para expressão dramática,
educação física, música, dança ou um conjunto de atividades que consigam que o
corpo disponibilize maior capacidade expressiva, de empatia, de modo a tornar
os cidadãos mais cultos, com maior capacidade de ética e de cidadania e
portanto não estar apenas centrado nos rankings. Está provado cientificamente
que crianças com maior nível de atividade física e relacional no recreio
aprendem mais na sala de aula. Portanto, não podemos querer crianças
sedentárias ou a ouvir um conhecimento que muitas vezes não lhes interessa. O
ensino não pode ser isto no século XXI.
A gestão do tempo da família também tem de mudar?
Temos de dar um ar fresco a este país, este país não
pode estar com esta depressão enorme em que temos pais e professores esgotados,
porque as crianças reparam em tudo. Há pais que já não têm prazer em brincar
com os filhos, e há professores que já não têm capacidade de perceber a
importância dessa atividade espontânea do que é correr atrás de uma bola, subir
a uma árvore, fazer um jogo de grupo no recreio ou pura e simplesmente subir o
muro e tentar descobrir o que está do lado de lá. Ou ter locais secretos. Como
é que nós promovemos a saúde pública e mental numa perspetiva de maior
cidadania, de maior empreendedorismo e de maior grau de felicidade? É isso que
está em causa quando falamos em promover o corpo em movimento. Nunca foi tão
importante o papel dos pais e da família na educação dos filhos no que diz
respeito à implementação deste tipo de atividades. Sair com as crianças para a
rua e brincar, desfrutar a natureza. Os pais têm de ter mais tempo disponível
para fazer este tipo de atividades. É inacreditável que hoje se passeiem mais
os cães do que as crianças. Inacreditavelmente faz-se hoje um esforço
inadmissível de tornar os robôs mais humanos e ao mesmo tempo estamos a
robotizar o comportamento humano.
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